Grandes Esperanças – Romances seculares que recomendamos [7]
Certa vez o editor de uma revista me convidou para, juntamente com outros colaboradores, responder à pergunta: “Qual é o melhor romance originalmente publicado em inglês?”. Minha resposta foi: Grandes Esperanças , de Charles Dickens. Grandes Esperanças foi recomendado a mim quando estava me preparando para ir para o meu primeiro curso Wheaton in England.[1] Ao longo dos anos eu sustentei que este romance é a melhor introdução possível ao povo e aos lugares da Inglaterra.
A “britanicidade” de Grandes Esperanças está relacionada ao meu primeiro elogio do romance. A primeira coisa que desejamos ao nos sentarmos para ler um romance é sermos transportados. Grandes Esperanças corresponde às expectativas. Nenhum escritor de ficção superou Dickens no dom de criar mundos. O mundo para o qual somos transportados quando lemos Grandes Esperanças é a Inglaterra britânica e vitoriana por excelência. É um mundo de natureza e campo, cidadezinhas e Londres.
Uma segunda coisa que desejamos ao nos envolvermos com a leitura de um romance é sermos entretidos. A defesa hedonista da literatura (a literatura defendida com base no princípio do prazer) sempre exerceu influência primária sobre mim. Lemos literatura em nossos momentos de lazer, e o lazer foi feito para ser desfrutado. Grandes Esperanças nos proporciona o lazer que buscamos.Ele também é uma obra-prima cômica. Entre os autores ingleses, Dickens está ao lado de Chaucer e Shakespeare como nossos maiores humoristas. Sua comédia é dividida entre comédia oriunda dos personagens e comédia oriunda das situações do enredo (“situation comedy”).
Dickens foi um estilista e artífice da palavra do mais alto calibre, e a obra em que ele mais deu provas disso foi em Grandes Esperanças, seu último grande romance. Ele pôde imortalizar momentos, dada a forma como os expressou. Seu estilo brilhante é autocompensador.
Quando dou aulas sobre Grandes Esperanças, dedico módulos para cada um dos três elementos que compõem a estória – ambiente, criação do personagem e enredo. Posto-me diante da lousa e peço aos meus alunos que reúnam as características que a raça humana mais gosta de ver em uma estória. Quando as respostas que eles fornecem preenchem a lousa, fica óbvio que Grandes Esperanças cumpre todos os critérios.
O que dizer da verdade de Grandes Esperanças? Um tipo de verdade que representa a experiência humana com precisão. Um escritor de ficção nos induz a encarar a vida, e o conhecimento que advém disso é conhecimento na forma de ver corretamente – ver as coisas com exatidão. Praticamente tudo que Dickens retrata em Grandes Esperanças “acerta” em sua interpretação acurada da experiência humana.
E a edificação, onde é que fica? Eu mesmo coloco a literatura como um todo em uma sequência com três categorias principais:
- Literatura cristã;
- Literatura de esclarecimento e humanidade compartilhada;
- Literatura de descrença
Grandes Esperanças se encaixa na categoria do meio. Ele não endossa explicitamente a fé cristã (embora contenha muitas referências bíblicas), mas se harmoniza facilmente com o cristianismo. Em especial, ele levanta a questão dos valores de forma proveitosa. Pip perde sua alma (metaforicamente falando) quando baseia sua vida em suas “grandes esperanças” de uma vida de sossego material baseada no dinheiro herdado, e ganha sua alma (em um sentido moral, mas não espiritual) quando abandona suas grandes esperanças e baseia sua vida no amor, nos relacionamentos pessoais e no contentamento com a vida comum.
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