xmlns:b='http://www.google.com/2005/gml/b'xmlns:data='http://www.google.com/2005/gml/data' xmlns:expr='http://www.google.com/2005/gml/expr'> Vida Cristã: A LEI DO SINAI – A NORMA DA ALIANÇA

domingo, 13 de agosto de 2017

A LEI DO SINAI – A NORMA DA ALIANÇA

Pr. Plínio Sousa.


A LEI DO SINAI – A NORMA DA ALIANÇA


INTRODUÇÃO

A principal característica da Aliança Mosaica foi a sumarização da vontade de Deus. Nas ministrações anteriores da Aliança, Deus já havia revelado muito da sua vontade ao povo, mas nunca tinha feito isso formalmente. No Monte Sinai, Deus providenciou ao povo, um padrão claro e compreensível de sua vontade, através do qual, aquele povo deveria viver. Assim, Deus levou sua Aliança a um novo estágio. Aliança é um acordo formal estabelecido entre duas partes. Contém a ideia de estabelecer um contrato, uma espécie de acordo obrigatório. Porém, a diferença básica entre um contrato e uma Aliança constitui-se no fato de que, um contrato, geralmente, é estabelecido entre partes iguais, com direitos e deveres iguais, cujos termos são definidos através de uma negociação entre as partes. Porém, na Bíblia, assim como no Antigo Oriente Médio, os tratados entre suseranos e vassalos não tinham pé de igualdade. Ao contrário, o suserano, o vencedor de uma guerra, obrigava seu vassalo a assinar um contrato de submissão. O suserano garantia a proteção do vassalo, porém, não havia negociação nos termos. Podemos dizer, portanto, que enquanto o contrato é bilateral, a aliança caracteriza-se por ser unilateral. Como diz Machen, “o pacto é uma expressão da vontade de Deus, não do homem, e o homem deve aceitar as condições que lhe propõem, confiar em Deus, que são santas, justas e boas, e ordenar sua vida em consequência” (1969, p. 153).

A diferença entre as alianças dos suseranos antigos e seus vassalos, da aliança entre Deus e seu povo é que a Aliança divina é abençoadora, para o bem do seu próprio povo. Todas as exigências da Aliança não são imposições aleatórias que visam beneficiar o suserano, antes, são aspectos formais que têm a função de abençoar e aperfeiçoar o povo da Aliança. É nesse sentido que devemos ver a Lei do Sinai, como um aspecto da Aliança. Devemos relembrar que, apesar de haverem várias alianças ao longo da história bíblica, tecnicamente há apenas uma Aliança. Ou seja, as alianças são unificadas. Detalhes particulares das alianças podem variar. Há progresso, à medida que cada nova aliança é ratificada, até porque a revelação é progressiva. Mas elas se unem, pois, cada vez que Deus iniciava uma nova aliança com Abraão, Moisés ou Davi, Ele não limpava o quadro e começava tudo de novo, mas avançava em relação a seus propósitos originais, a um nível superior de realização. Assim, a Lei revelada no Sinai é um avanço da Aliança que veio para cumprir um propósito específico na história da redenção. Portanto, “a lei de Deus não é uma lei arbitrária ou sem sentido; é uma lei santa, como Deus mesmo é santo” (Machen, 1969, p. 191). Essa lei foi revelada na Aliança com Moisés. Como diz Robertson “com Moisés tornou-se explícito um sumário total da vontade de Deus através da escrituração física da lei. Este sumário da vontade de Deus, externo ao homem, formalmente ordenado, constitui o caráter distintivo da aliança mosaica” (1997, p. 155).

Aspectos formais da Aliança do Sinai.

Uma Aliança é composta de partes ou elementos. Basicamente esses elementos são: Declaração de suserania, preâmbulo histórico, exigências, testemunhas, bênção e maldição. Êxodo 20 nos ajuda a entender como funciona a Aliança, pois esses elementos estão presentes. O texto diz: “Eu sou o Senhor teu Deus” (v. 2). Estão explícitos aí os participantes da Aliança. Deus é o suserano, o povo de Israel é o vassalo. Em seguida vem um preâmbulo histórico: “que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão” (v. 2). Este é o feito divino pelo qual Ele exige o compromisso do povo. Em seguida vem o requerimento do Senhor em relação aos israelitas: “não terás outros deuses diante de mim [...]” (v. 3). Ao todo são citados dez mandamentos como exigências do Senhor dentro da Aliança. As testemunhas, nesse caso, são o próprio povo, que viu a manifestação de Deus naqueles dias (v. 18). Noutra ocasião, ratificando essa mesma Aliança Deus disse: “Hoje, tomo por testemunhas contra vós outros o céu e a terra, que, com efeito, perecereis, imediatamente, da terra a qual, passado o Jordão, ides possuir; não prolongareis os vossos dias nela; antes, sereis de todo destruídos” (Deuteronômio 4:26). Também, na Aliança são estabelecidas as punições e as recompensas para o descumprimento e cumprimento respectivamente: “Eu Sou o Senhor teu Deus, Deus zeloso, que visito a iniquidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem, e faço misericórdia até mil gerações daqueles que me amam e guardam os meus mandamentos” (v. 5, 6). Esse padrão bíblico pode ser visto em todas as formulações da Aliança, como em Moisés, Abraão, Adão e Jesus.

Os elementos que apontam para a justiça, para a santidade e para a misericórdia de Deus estão presentes. No Sinai, Deus levou a Aliança a um elevado estágio. Mas é preciso lembrar que foi o momento em que a nação de Israel estava se formando. Portanto, a Aliança Mosaica teve elementos formais aplicáveis apenas àquele momento histórico. Nisso devemos incluir todas as regulamentações do sacerdócio, todas as leis de purificação e de seleção de alimentos. Todas essas leis tinham apenas a função de tornar Israel uma nação separada. No caso específico da dieta alimentar, Deus proibiu uma série de alimentos ao povo de Israel, e a razão o próprio Deus disse: “Eu sou o SENHOR, vosso Deus; portanto, vós vos consagrareis e sereis santos, porque eu sou santo; e não vos contaminareis por nenhum enxame de criaturas que se arrastam sobre a terra” (Levítico 11:44). Podemos perceber claramente que esses aspectos cerimoniais da Lei não permaneceram no Novo Testamento, pois Jesus considerou todos os alimentos puros (Marcos 7:19), e Paulo disse que questões de comida e bebida não tinham nada a ver com o reino de Deus (Romanos 14:17), nem seriam motivo de julgamento entre os crentes (Colossenses 2:16). Mas os aspectos morais da Lei continuam valendo, pois, o próprio Senhor Jesus os validou e expandiu (Mateus 5:17), mostrando a importância de considerar o cumprimento da Lei, não apenas uma formalidade, ou um aspecto externo, mas um aspecto interno. Assim, a respeito do sétimo mandamento, Ele disse: “Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela” (Mateus 5:27, 28). Portanto, a Lei moral continua valendo, pois ela não revela apenas um aspecto específico de uma exigência localizada feita por Deus ao povo de Israel para que se diferenciasse de seus vizinhos, antes é uma demonstração clara da vontade imutável de Deus. Porém, continua valendo não como um meio de o homem se salvar, até porque, ela nunca teve esse propósito.

A lei do Sinai não deve suplantar a Aliança, pois a Aliança é superior a Lei. A Lei, na verdade, é um aspecto da Aliança. A entrega da Lei não veio prover uma nova forma de salvação, a salvação continuou sendo pela promessa, da mesma forma que fora antes, mas a Lei veio demonstrar, com detalhes, qual era a vontade de Deus. É o sistema de sacrifícios, instituído juntamente com a Lei, que nos demonstra que a salvação continua sendo pela graça, mesmo nos tempos mosaicos. Embora Deus tenha estabelecido a Lei e exigido seu cumprimento, cabendo pena de morte ao transgressor, não obstante, estabeleceu um sistema de sacrifícios que espiava a culpa do transgressor. O crente do Antigo Testamento não foi salvo porque guardava a Lei, no sentido de obedecer perfeitamente aos mandamentos, mas porque confiava nesse sistema expiatório, que, em última instância, apontava para Cristo (Romanos 3:19 – 21; Gálatas 2:16 – 21; 3:11).

O conteúdo da Lei.

Os dez mandamentos que Deus revelou a Moisés na Aliança do Sinai compõem o melhor resumo de uma vida piedosa. Não há aspecto da existência e do relacionamento do homem com Deus e com o seu próximo que não tenha sido contemplado. Os dez mandamentos são um padrão universal de comportamento. Onde quer que eles tenham sido aplicados, sempre colaboraram para a formação de uma sociedade mais justa e igualitária. Geralmente, se entende que os dez mandamentos eram divididos em duas tábuas de pedra. A primeira tábua continha os mandamentos que tinham relação mais direta com Deus, e a segunda com os semelhantes. De fato, os primeiros quatro mandamentos são exigências, que têm a ver com a submissão direta a Deus. O primeiro estabelece o monoteísmo estrito: “Não terás outros deuses diante de mim” (Êxodo 20:3). O segundo é uma proibição para se fazer imagens que representassem a divindade (Êxodo 20:4 – 6). Diferentemente de todas as outras supostas divindades, que se apresentavam com alguma forma, o Deus de Israel se apresentou como o invisível. Portanto, era proibida, tanto alguma formulação do Deus de Israel, quanto de alguma outra divindade. O terceiro mandamento proibia que se utilizasse o nome de Deus de forma vã (Êxodo 20:7). O nome de Deus era Yahweh. Os judeus tiveram tanto cuidado com esse mandamento que, como já vimos, a própria pronúncia do nome de Deus se perdeu. E o quarto mandamento estabelecia um dia de descanso, o sétimo, conectando-o com o sétimo dia da criação, e assim, o povo teria um dia da semana para dedicar exclusivamente a Deus (Êxodo 20:8 – 11). Jesus resumiria essa tábua da Lei com a definição: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento” (Mateus 22:37, 38). Os seis mandamentos seguintes expressam aspectos do relacionamento entre as pessoas debaixo da submissão à vontade de Deus. O primeiro desses (o quinto) é a responsabilidade para com os pais: “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá” (Êxodo 20:12). A lógica é impressionante, pois se o respeito ao próximo não começar dentro da própria casa, tudo o mais será falso. Então vem a sequência de declarações curtas: “Não matarás. Não adulterarás. Não furtarás. Não dirás falso testemunho contra o teu próximo” (Êxodo 20:13 – 16). Assim o sexto, o sétimo, o oitavo e o nono mandamentos preservam, especificamente, de prejuízos o próximo, em todas as áreas, desde a integridade física, à integridade moral. Por fim, o décimo mandamento, é uma espécie de resumo dessa segunda tábua da lei, apontando para a própria origem das atitudes proibidas: a cobiça. O texto diz: “Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma que pertença ao teu próximo” (Êxodo 20:17).

Essa tábua da Lei, Jesus resumiu do seguinte modo: “O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas” (Mateus 22:39, 40). A Lei é um aspecto da Aliança, que veio justamente explicitar o caráter de Deus e a sua vontade para seus servos. Na Nova Aliança, a lei continua valendo, mas como tudo foi aperfeiçoado na Nova Aliança, também a lei foi aperfeiçoada. Podemos ver um dos aspectos desse aperfeiçoamento no estímulo positivo, que a Lei recebe através de Jesus, compensando o negativo que possuía em Moisés. Quase todos os mandamentos do decálogo começam com a expressão “Não”. Mas, como vimos, Jesus resumiu as duas tábuas em termos positivos, começando com a palavra “amarás”. O imperativo permanece, mas poderíamos dizer que é um imperativo positivo, que compele à ação, e não meramente um imperativo negativo que impede uma atitude pecaminosa. Em Jesus, mais do que evitar um comportamento pecaminoso, é preciso avançar para uma atitude positiva de amor por Deus e amor pelo próximo. Como diz Sproul, “quando as regras são mantidas por causa de si mesmas, então a obediência é dada a uma fria abstração conhecida como a lei, em vez de ser dada a um Deus pessoal que revela a lei” (1998, p. 226). Esse foi o erro dos fariseus, e a interpretação da Lei feita por Jesus precavia disso. Um segundo aspecto desse aperfeiçoamento já foi mencionado de passagem e, tem a ver com esse aspecto positivo da Lei na Nova Aliança. Tem a ver com as explicações e interpretações que Jesus deu à Lei. No capítulo cinco de Mateus, Jesus explicou e interpretou a Lei de um modo diferente do que os mestres da lei faziam, e, até mesmo, diferente do que a própria Lei do Sinai ordenava. Ele pôde fazer isso, porque é o autor da Lei, e é o único que sabe realmente dizer o que é pretendido através da Lei. A repetida expressão “ouvistes que foi dito aos antigos (Mateus 5:21) [...] eu porém vos digo (Mateus 5:22)”, demonstra que Jesus estava restaurando a verdadeira interpretação da Lei. Muita coisa, dentro daquilo que havia sido “dito aos antigos”, não era o que Moisés disse, e sim o que os antigos disseram sobre o que Moisés disse. Nesses casos, Jesus não estava corrigindo a Lei de Moisés, mas justamente a interpretação que os antigos intérpretes e também os modernos estavam fazendo da Lei. O “eu vos digo” corresponde ao “Assim diz o Senhor” dos grandes profetas (Manson, 1965, p. 286). Portanto, “com base na autoridade de sua própria palavra, Jesus rejeitou as interpretações que os escribas fizeram da lei, as quais foram consideradas como parte integrante da própria Lei” (Ladd, 1997, p. 117).

Assim, Jesus queria que as pessoas entendessem que o verdadeiro pecado nasce lá no coração e não tem a ver apenas com atitudes externas e consumadas. Mas, algumas afirmações de Jesus parecem corrigir o que o próprio Moisés dissera, por exemplo: “Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente” (Mateus 5:38). Essa expressão foi dita pelo próprio Moisés, logo após ter passado ao povo os Dez Mandamentos (Êxodo 21:24, 25). Tinha a intenção de estabelecer uma justiça retributiva. O que alguém fazia ao seu próximo deveria ser feito a ele. Mas percebemos como Jesus modificou isso dizendo: “Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra” (Mateus 5:39). Há muita diferença entre arrancar um dente de alguém que arrancou o seu, e oferecer a outra face a alguém que lhe bateu. Na verdade, são coisas diametralmente opostas. O “olho por olho, dente por dente” era uma legislação que considerava apenas a justiça conforme os fatos. Oferecer a outra face reflete uma compreensão maior da graça e da misericórdia. Nesse ponto, a Nova Aliança em Jesus se revelaria superior à Aliança mosaica, pois a própria Lei recebeu adaptações. No entanto, é possível ver que, não houve modificação na essência da Lei, e sim na aplicação. Embora uma pessoa continuasse tendo o direito de se defender, e usar a lei do talião, o que Jesus está dizendo é que é possível uma atitude mais elevada –, uma atitude de amor e perdão. Uma das adaptações explícitas diz respeito ao quarto mandamento.

O dia de descanso foi mudado do sétimo para o primeiro dia da semana. A essência da estipulação permanece a mesma, porém, o dia foi adaptado. Na Nova Aliança, o dia de descanso passa a ser o Domingo, por ser o dia da ressurreição. O Novo Testamento em lugar algum manda o crente guardar o Sábado, mas mostra que Jesus ressuscitou no primeiro dia (João 20:1, 19), que apareceu novamente no primeiro dia da semana (João 20:26), que a Igreja de Atos se reunia para celebrar a Santa Ceia no primeiro dia (Atos 20:7), e que recolhia ofertas nesse dia (1 Coríntios 16:2). O evento histórico da ressurreição, acontecido no primeiro dia da semana, foi suficiente para que a Igreja primitiva passasse a guardar esse dia como o Dia do Senhor (Apocalipse 1:10). Sabemos isso, não apenas dos escritos bíblicos, mas também dos escritores primitivos, dos tempos da Igreja pós–apostólica, como Justino, Dionísio, Irineu, e outros que foram, inclusive, discípulos dos apóstolos. Eles nos dizem que os cristãos guardavam o primeiro dia da semana. Justino (100 – 167 d.C.), por volta do ano 150, fez a mais completa descrição do culto na Igreja Primitiva, em que ele se referiu ao Domingo como dia de culto: “No dia que se chama do sol [domingo], celebra-se uma reunião de todos os que moram nas cidades ou nos campos, e aí se leem, enquanto o tempo o permite, as Memórias dos apóstolos [quatro Evangelhos] ou os escritos dos profetas [...]”. (1995, 67.7, p. 83 – 84). Justino inclusive explicou o porquê de a Igreja guardar o Domingo: “Celebramos essa reunião geral no dia do sol, porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, fez o mundo, e também o dia em que Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou dos mortos”. (1995, 67.7, p. 83 – 84). Outro documento que atesta a antiguidade da guarda do domingo por parte da Igreja Cristã, é o Didaquê (c. 120 d.C.), documento anônimo, o qual usa a mesma linguagem de João se referindo ao domingo como o “dia do Senhor”: “Reunindo-vos no dia do Senhor, parti o pão e dai graças [...]” (1957, p. 75).

A razão da Lei.

Deus sempre teve um mesmo jeito de salvar os pecadores. A salvação em ambos os testamentos é pela graça. A lei teve e tem um papel importante no esquema de salvação divino, mas jamais foi o instrumento de Deus para salvação. Quando Deus revelou sua Lei no Sinai, estava revelando ao homem a sua vontade que resumia tudo o que era bom, perfeito e agradável. Mas o simples fato de Deus ter revelado juntamente com a Lei moral, também a Lei cerimonial, cujo significado central era a expiação, já demonstrava que a salvação não era pela rígida observância dos mandamentos. Quando Deus estabeleceu o sistema de sacrifícios, no qual animais eram sacrificados para expiar o pecado dos homens, deixou bem claro que a salvação sempre foi, e sempre será pela graça. Somente a graça de Deus poderia aceitar que um animal fosse sacrificado no lugar do homem, isentando o homem de pagar com sua vida por seus pecados. Por isso, Jesus é chamado no Novo Testamento de “o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (João 1:29). Porque Ele realizou definitivamente o que aqueles cordeiros do Antigo Testamento realizavam apenas temporariamente. E isso nos faz lembrar que “a salvação é um dom, e o pecador não contribui com nada, tendo apenas as mãos vazias estendidas para recebê-la” (Wright, 1998, p. 102). Na Teologia Reformada costuma-se falar em três usos da Lei. O primeiro uso é como preparação para salvação. Paulo fala da Lei como sendo um “aio”. Ele diz: “Mas, antes que viesse a fé, estávamos sob a tutela da lei e nela encerrados, para essa fé que, de futuro, haveria de revelar-se. De maneira que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio” (Gálatas 3:23 – 25). Nesse sentido a Lei funciona como preparação para salvação. Ela é responsável pelo convencimento do pecado, pois, aponta para nossas falhas (Romanos 3:20).

A função da Lei é nos levar a Cristo, pois ela mostra que sem Cristo estamos condenados, por causa de nossos pecados. A lei ainda serve como um “fator de contenção”. Esse uso da Lei é chamado de “uso político ou civil”. Nesse sentido a Lei atende ao propósito de restringir o pecado e promover a justiça. Ela age como refreadora do pecado dos homens. Ela inspira a formação das próprias leis gerais, que regem a maioria das nações do mundo, e age no interior das pessoas, sob a forma da “consciência” impedindo que os homens pequem, tanto quanto poderiam pecar (Romanos 2:15). E, finalmente, há também o terceiro uso da lei que é como “instrumento de santificação”. Nesse sentido ela é a norma de vida para os crentes, um fator de contribuição para a santificação. É claro que, nesse sentido, em nada ela contribui para a salvação, mas quem já está salvo pode fazer uso da Lei de Deus para se aperfeiçoar, cada vez mais, no caminho da santidade. O que precisa ficar claro desses três usos propostos para a Lei é que nada disso tem a ver com a salvação. A salvação é um dom de Deus. A Lei serve ou para conduzir a Cristo, ou para ajudar quem já está em Cristo. Mas é Cristo que salva, e somente Ele (Solus Christus). Entendendo que a função da lei não é, nem nunca foi salvar, Paulo repreende os crentes da Galácia por estarem usando a Lei indevidamente. Com sua ênfase na necessidade da circuncisão, eles estavam fazendo da lei o instrumento da salvação. Por esse motivo Paulo fala: “Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará” (Gálatas 5:2). De fato, se quisessem ser salvos pela Lei, não haveria a necessidade de Cristo. Te- riam que guardar toda a Lei e não tropeçar em nenhum ponto (Tiago 2:10). Nesse sentido realmente era a Lei, ou Cristo, pois, no sentido de salvação, Cristo é o “fim da Lei para justiça de todo o que crê” (Romanos 10:4). Nunca foi intenção de Deus salvar alguém pela Lei. Segundo o Apóstolo Paulo, a justificação pela fé confirma a própria lei: “Anulamos, pois, a lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei” (Romanos 3:31). Portanto, para Paulo, o propósito da lei e a justificação pela fé não são coisas contraditórias, mas complementares. A Lei não é algo que está necessariamente contra a graça. No propósito de Deus, a Lei é um aspecto da graça. Ela unicamente se torna um empecilho para a graça, quando as pessoas fazem um mau uso dela, tentando ser salvos através dela, como era o caso dos fariseus e do próprio Paulo, antes de se encontrar com o Senhor. Em sua essência, a lei não pretende ser o meio de salvação, antes, é um aspecto da Aliança da Graça, conforme o próprio Paulo deixou bem claro ao falar sobre a promessa, que é anterior a lei (Gálatas 3:17, 18).

Conclusão.

A lei tem seu papel dentro da Aliança, não como modo de salvação, mas como maneira de Deus demonstrar ao homem seu caráter e sua vontade. Assim, a lei não compete com a graça, antes faz parte dela. A lei é um poderoso instrumento da graça para trazer a convicção de pecados que é necessária para a verdadeira conversão. E a lei é um instrumento apropriado para o desenvolvimento da salvação, pois ela revela a vontade de Deus. Segundo Paulo, o problema não estava em alguma falha ou inconsistência da lei do Antigo Testamento, mas nas pessoas, que desejavam estabelecer sua própria justiça e não aceitavam a justiça que vem de Deus (Romanos 10:3). Portanto a Lei não constituiu uma forma específica de salvação que perdurou por algum tempo e que, com a chegada do Evangelho, deixou de ter valor. A Lei nunca foi uma forma específica de salvação, antes ela fez e faz parte da Aliança e é um dos aspectos da Aliança da Graça. Assim podemos dizer que a Lei não é uma rival da graça, antes, é um aspecto da própria Graça. Ela revelou e revela aos homens qual é a vontade de Deus, seu caráter santo e justo. Ela revelou e revela que o homem não pode se salvar a si mesmo, e por isso precisa da provisão de Deus (no Antigo Testamento, os cordeiros; no Novo Testamento, o próprio Cristo –, o Cordeiro de Deus). Esse continua sendo, para o crente, o padrão de comportamento que se espera quando se vive sob a Aliança. A lei não é uma inimiga, mas sim uma grande aliada do cristão.

Paz e graça.

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